Quando não há meios institucionais que amplifiquem as vozes das crianças migrantes, é preciso se arriscar em um pedido de socorro. Se há algo que não falta nas milhares de crianças refugiadas, apesar dos traumas físicos e psicológicos da travessia; é a ousadia, a criatividade e o ímpeto em prol da sua comunidade e de si mesmas. Foi o que fez uma menina migrante em um centro para refugiados em Manston, Reino Unido, ao escrever uma carta e enviá-la através de uma garrafa de plástico enquanto furava o bloqueio de segurança do local.

A carta, escrita em um inglês limitado, dizia: ‘Estamos com uma vida difícil agora, nós nos sentimos como se estivéssemos na prisão’. E acrescentava: ‘Alguns de nós estão muito doentes, tem algumas mulheres que estão grávidas e não fazem nada por elas, precisam muito da sua ajuda. Por favor nos ajude. Não é fácil para quem tem filhos. Tem um monte de criança que não deveriam estar aqui. Eles deveriam estar em uma escola, não em uma prisão.‘ A menina também descreve que há uma criança migrante com deficiência no local, e que os médicos só receitam paracetamol, mas: ‘Ele está muito ruim, eles nem se importam com ele’.

Menina migrante quebra a segurança do centro para refugiados e joga uma garrafa com uma carta. Foto: Reuters

Testemunhas disseram terem visto guardas no local conduzindo as crianças migrantes para dentro do centro quando os jornalistas se aproximaram da cerca. A menina, corajosamente, jogou uma garrafa de plástico com a carta endereçada aos jornalistas, instituições e organizações expressando o desejo: “Queremos falar com você, mas eles nem nos deixam sair”, antes de ser detida de volta pelos seguranças.

Não há informações sobre a situação desta menina migrante, após ser reconduzida para as instalações, ou se foi penalizada pelos agentes que administram o local. Ali, naquele momento, aquela criança mostrou ao mundo a capacidade das crianças migrantes como sujeitos sociais ativos, diante de um mundo que as olham como sujeitos passivos e incapazes de falarem por si, invisíveis nas negociações e acordos internacionais que pautam sobre elas mesmas. O fato é, uma realidade desumana e cruel as é imposta; e ela foi corajosa o bastante para arriscar a sua vida mais uma vez para que pudesse ser ouvida. E nós, o que somos capazes de fazer?

“Queremos falar com você, mas eles nem nos deixam sair”. Foto: Reuters

*Texto escrito por Camila Santos Barros Moura, fundadora da comunidade virtual Migrações em Debate.

Foto da Capa: Reuters

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