Qual foi a última você se perguntou: espera, o que realmente eu estou fazendo aqui? Confesso que nos últimos meses deixei de me fazer esta pergunta. Mais uma mudança, trabalhos, mestrado, saudade. É engraçado como cada vez mais estamos criando a habilidade de viver em nosso mundo particular, e de se desligar de tudo que está ao nosso redor, daqueles que não conhecemos, mas que fazem parte do que nós somos.


Seria ingênuo dizer que mesmo querendo escapar da realidade criada por nós, no qual escolhemos as notícias que queremos ver, pulamos frases de um livro ou artigo sem paciência para ler, deixamos não só de olhar nos olhos um dos outros, mas de enxergar o outro que está em nossa frente; ainda assim, habitamos no mesmo universo? E se somos parte de um mesmo plano, por que continuamos sentados no sofá com os olhos vendados para o que nos acontece como humanidade? Verdade seja dita: é tão cômodo que parece ser bom, pois “não dá para mudar nada, de qualquer forma”.


Foi como acordar mais uma vez quando essa pergunta voltou a rondar a minha mente. Era mais uma aula do mestrado, mais uma discussão sobre as migrações. Falamos das pessoas migrantes mantendo aquela distância segura daquilo que se estuda, e tudo isso em nome da tal “verdadeira ciência”. Chegamos ao ponto de se incomodar mais com palavras como amor e compaixão do que com guerra, privilégios e fome, e isso tudo porque é fácil se isolar no mundo das teorias, títulos acadêmicos ou relatórios bonitos. E é exatamente aí que deixamos de nos perguntar: espera, de que serve tudo isso mesmo se não for para eu usar pelo outro?


Eu não quero perder a capacidade de sentir a dor pelos bebês em Gaza que devido à fome causada pelo genocídio, perderam forças até para chorar. Eu não quero perder a capacidade de enxergar o outro que luta todos os dias simplesmente para existir, e ali ver além de uma nacionalidade, status migratório ou etnia. Eu simplesmente não quero ficar no mundo do sofá e da sala de aula que se distancia de quem pode até estar há milhares de quilômetros, mas que é parte de mim. Não quero mais perder tempo, quero me perguntar quantas vezes for possível: espera, o que é que estou realmente fazendo aqui?

*Texto escrito por Camila Santos Barros Moura, fundadora da comunidade virtual Migrações em Debate

Comments are closed

“Por um mundo onde se possa viver sem fugir.”
Arquivos
Migrações em Debate

O Migrações em Debate é uma comunidade e espaço de construção de conhecimentos e diálogo sobre as temáticas de migrações e refúgio.

Brasil
Camila Barros contato@migracoesemdebate.com
“Por um mundo onde se possa viver sem fugir.”
Arquivos
Categorias